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Artigo de Joana Capucho para o jornal Público, em 1 de maio de 2018.
Há professores com alunos amigos no Facebook. Psicólogos, pais e diretores alertam para risco ético
"Os estudantes são muito dependentes do telemóvel. Por isso, as redes sociais podem ser úteis como instrumento de trabalho. Nunca tive nenhum problema." Filipe Carvalho, professor de Educação Física, de 40 anos, usa o WhatsApp para comunicar com os alunos da sua direção de turma, bem como com a equipa do Desporto Escolar. "Tenho quase todos os alunos no Facebook. Começámos por comunicar num grupo fechado, mas eles agora aderem mais ao WhatsApp", conta ao DN.
Na rede criada por Mark Zuckerberg, o professor, a dar aulas no ensino secundário em Elvas, não publica nada que lhe "possa trazer desvantagens caso os alunos vejam". Pelo contrário, faz "publicações relacionadas com o desporto, precisamente para que vejam e se motivem". Já na aplicação de troca de mensagens, alerta para coisas importantes como datas de exames, alterações de salas ou reuniões com os pais. "A informação circula mais facilmente", explica.
Esta é uma questão que foi recentemente abordada por Alexandre Henriques, professor, pai e autor do blogue Com Regras. "Quando publiquei o artigo sobre o tema ["Devem os professores ter alunos no seu Facebook?"], percebi que a maioria dos professores não abre a porta da sua "casa". Tem de haver um certo resguardo. Mas há quem contacte os alunos por WhatsApp, por exemplo." No seu caso, adianta, só estabelece amizade com ex-alunos. Vê como principais perigos o contacto pós-laboral, questões sobre as notas e deturpações das partilhas ou comentários dos docentes.
Na opinião de Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, a conexão nas redes sociais "não acrescenta nada à relação professor-aluno". É algo que não recomenda, contudo, sublinha, "é uma questão que deve ficar ao critério da consciência de cada professor". Caso este considere que há benefícios, "deve usar da equidade no tratamento, ou seja, aceitar os pedidos de todos os alunos".
"Não é uma ideia muito feliz"
Admitindo que pode ser "conservador" e que nunca pensou muito sobre o assunto, Rui Canário, especialista em ciências da educação, diz que não é "absolutamente contra" a relação de amizade entre professores e alunos no Facebook, mas atendendo "ao papel dos professores e às pinças com que é preciso lidar com a utilização das redes sociais," não considera "que seja uma ideia muito feliz".
Ao DN, o professor aposentado explica que os docentes "devem manter uma certa reserva, não na utilização das redes sociais mas na relação direta com os alunos". Isto permite, segundo o mesmo, "que o professor tenha uma atitude mais interventiva para ajudar os alunos a lidarem com sensatez com as redes sociais". Defende, ainda, que não se devem relacionar como se estivessem no mesmo patamar.
Cuidado e cautela são também palavras-chave para os pais. "O professor tem de avaliar com cuidado esse tipo de amizades. Nada o proíbe, mas é preciso cuidado com o que se publica nas redes sociais", diz Jorge Ascenção, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais. Na opinião do representante, "não é nada aconselhável usar esses meios para fazer comunicações".
Já Fátima Pinho, presidente da Federação Nacional de Associações de Estudantes do Básico e Secundário, considera que "a "amizade" entre professores e alunos nas redes sociais é tão válida como a amizade existente em contexto escolar". Destaca que há uma "facilidade na comunicação", mas reconhece que pode levar "a uma diferenciação no tratamento/respeito dos alunos pelos professores e vice-versa".
Embora só tenha no Facebook ex-alunos, Alexandre Henriques reconhece que as redes sociais também podem ter benefícios na relação com os mais jovens: "Se os professores estiverem mais próximos, leva a uma maior afinidade e empatia, o que é salutar para o processo de aprendizagem."
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